Trova do Rics

quinta-feira, 24 de março de 2011

O Paradoxo de Geisy

Apesar de ser um texto que escrevi há algum tempo, o considero atemporal e até pertinente...


É triste constatar que existe um lugar no mundo onde as efêmeras (ou seriam enfermas?) “celebridades” que emergem das águas turvas da ignorância intelectual e moral sobrepujam ícones e mártires da nossa história.  

Sim, esse lugar existe e se chama Brasil. Onde os “Big brothers” permeiam com fulgor, imponentes, em festas de pessoas que mal conhecem ou acontecimentos que nem lhes dizem respeito. Sentem-se como ídolos, amados e cultuados (e infelizmente são)... E isso ocorre pela baixeza intelectual de um povo que, assiduamente, por dez anos, cultua esse programa imbecil. Ainda aqui, nessa terra subdesenvolvida, a tal “Bruna Surfistinha” tornar-se-á exemplo à nossa “juventude transviada”, quiçá personagem histórica, pois há quem estude sua vida e a “traduza” em livros, peças teatrais e mini-séries. E os avarentos “donos” da pátria gozam o ópio do poder e menosprezam até a ignorância dos que os puseram lá; desdenham de forma proposital e consciente da estupidez generalizada pois a manutenção desse “status quo” facilita a sua manipulação.
Seria cômico se não fosse trágico...
Não há consciência de que a culpa de tudo isso é de quem julga. A tal Geisy, gordinha inepta e feia, é a representação nua e crua do estado vil e frívolo que vivemos. Virou celebridade instantânea, impulsionada pelos acéfalos “colegas” de faculdade que, sem terem o que fazer, sem uma causa significativa pra defender e ainda fomentados pelos meios de comunicação demagogos, exímios formadores de opiniões tendenciosas e oportunistas, aplaudem e ironizam a própria ignorância. Uns quiseram jogá-la na fogueira... Outros quiseram mitificá-la... Eis o “Paradoxo de Geisy”.
Paradoxo socrático: “Ninguém faz o mal voluntariamente, mas por ignorância, pois a sabedoria e a virtude são inseparáveis.”
Há os que clamam por justiça contra a ferocidade dos que jogaram pedras na “Maria Madalena” dos tempos modernos. Oportunistas, “pseudo-feministas”...
Do outro lado, há os paladinos da decência e dos bons modos. Machistas, moralistas, conservadores e “puritanos” que jogaram merda na “Geni” da vida real.
Contudo, há também os que percebem que o problema é muito mais complexo do que simplesmente questionar a censura, a postura, fazer bagunça ou defender o lado que tiver mais putaria e cachaça. Poucos estupefatos seres humanos que, à plena carga de suas faculdades mentais, não se conformam com a proporção tomada de um assunto tão vulgar e que não é a raiz do problema. O que se deve questionar é: Qual é o futuro desses “estudantes”? Serão os profissionais com essa bagagem técnica e intelectual pífia que cuidarão dos nossos filhos e netos? Não é o vestido ou os “inócuos” protestos que incomodam. O que incomoda é  a irresponsabilidade do governo em fazer vistas grossas à educação adotando uma política esdrúxula com objetivo único de alfabetizar, simplesmente. Porém, a maioria da população é incapaz de interpretar um texto... O que incomoda é ver esses estudantes sem uma causa nobre pra defender, sem a ingenuidade inerente da juventude, sem um objetivo comum. O que incomoda é saber que os verdadeiros artistas (pintores, autores, compositores, escritores, etc...) e intelectuais que realmente têm algo importante a dizer, cada um à sua maneira, estão acuados, envergonhados e esquecidos em algum canto. Pois seus trabalhos são imperceptíveis, invisíveis aos olhos dessa “platéia”. Vale, como nunca, o velho chavão: “Não se joga pérolas aos porcos”. O que incomoda é saber que não há limites para os vaidosos e mercenários. O que incomoda é saber que estamos em meio a um processo de inversão de valores onde a estética (harmonia das formas) sufoca a erudição com requintes de crueldade...
O que falta no “recheio” do vestido curto das Geisys da vida é conteúdo! “Falta cultura pra cuspir na estrutura...”
Sobra à inocente Geisy desfrutar das oportunidades mil provocadas pela mediocridade dos que lhe expuseram e que hoje lhe carregam de afagos e audiência por sua breve notoriedade. Vamos cultuar e apreciar o entulho nacional!
Enquanto isso, na sala da hipocrisia, a mídia aguarda, ávida, pela próxima “estrela nacional”. Se demorar a surgir do lamaçal, a mídia a criará.   

E “la nave va...”
 
“A vida é um paraíso, mas os homens não o sabem e não se preocupam em sabê-lo.” (Fiodor Dostoievski)